Hoje acordei com saudades, dos poucos e raros amigos.
Daí falei com a Sabrina e me emocionei falando da história de como conheci o Antônio e como minha vida mudou a partir daí. E me ouvindo contar a ela a história da sacola, sabe o que descobri? Cada um de nós ganha ao nascer um bilhete premiado. O meu foi atrair pessoas, individuos singulares, e ser aceita e acolhida por esses seres únicos, de brilho intenso. Não sei explicar, sempre dei muita sorte. Eu mesma não me acho especial. Mas a minha lista de amigos, essa sim, o é. Estou falando de amigos de verdade, gente do coração mesmo, não os do Facebook. Essas pessoas com quem a gente se sente a vontade, sabe? Que dividem o taxi, a conta do bar e as histórias boas e as de aprendizagem. Essas pessoas que são “de casa”, sabe? Que conhecem seu endereço, sua origem, seus demônios e segredos. Que já te viram sem maquiagem, sem controle e sem postura. Para as quais você pode pedir dinheiro emprestado, que ficam te esperando mais de uma hora quando você atrasa. Que te recebem, de mala e filho, para passar o mes das férias inteirinho na casa de praia, entende? Quem vai com você e segura sua mão, não importa onde; que reza contigo, para a entidade que você acredita; que passa vergonha contigo fantasiado no São João, no Halloween, ou no Fórum. Essas poucas e raras pessoas que não se cansam de te ouvir – bom no meu caso elas cansam, mas seguem ali fingindo que estão de boa. Estas mesmas pessoas que fazem planos com você, que te inspiram, te ajudam, trabalham para você de graça, na última hora, e torcem para você conseguir, sabe? Que não competem contigo, que vibram e se orgulham quando você consegue, que ficam chateadas, frustradas, e xingam junto, quanto você não consegue. Esses poucos que não se preocupam em te dizer a verdade (sim, sobre seu vestido, seu marido, seu hálito, suas escolhas) e que não se escondem quando é preciso quem te defenda diante de outros.
Bom, estou falando de amigos, leais e honestos, também nas suas trapaças, e com os quais você pode ficar sem contato por meses, anos até, mas quando os encontra de novo, é como se nunca os tivesse perdido. Lembra? Daquela pessoa que fala a sua língua, ainda que não o seu idioma? Aquela que não importa a idade, a fase da vida, se já “virou autoridade”, ou se mudou de profissão, de sexo, de nome ou de religião?Essa pessoa única, que, no mundo todo, a esmagadora maioria não conhece ninguém; poucos podem dizer que tem um; e que apenas os mentirosos alegam ter um montão, sabe? Bem, eu tive sorte, tenho alguns. Nem poucos e nem muitos, mas vários, diversos. Autoridades internacionais, grandes intelectuais, artistas famosos. Também destacados escritores, juristas, musicos e cantores (alguns de banheiro, como eu), poliglotas e esotéricos. Modelos e diplomatas, ativistas e feministas, influentes. Com todos os tons de gêneros e idades, de grandes e pequenas cidades, crentes, liberais, e também um ou dois que gostam de acordar cedo (eu não disse que eram perfeitos). E aí está você. Ai, Que saudades de ti!
Hoje acordei com saudades de vocês. Das conversas e projetos. Dos cafés e das risadas. Saudades dos encontros e dos abraços. Da esperança. Daí falei com a Sabrina e chorei. Não pelos reflexos da pandemia, pelo excesso de trabalho ou, já adiantando, não por estar “naqueles dias”. Chorei também por saudade de mim quando estou com vocês, por permitir que um sistema binários defina minhas prioridades.Chorei. Eu queria gritar, dançar, correr, suar. Sentir o coração quase sair pela boca, mas estava muito cansada, então só chorei. De frustração, de impotência. Chorei para aliviar o peso, da alma. Chorei conciente, como uma mulher adulta, mãe, latinoamericana, sem receio ou pudor. Chorei porque sou humana e o humano em mim é intenso. O humano em mim chora. E chora de cabeça erguida, porque aprendi que chorar é para os fortes. Chorar de saudade é para poucos. E chorar por vocês, é um presente. Hoje acordei com saudades. Saudades de mim. E por isso me mimei um pouco.
Hoje acordei com saudades, e chorei. Amanhã eu não sei.