Saúde mental materna e depressão pós-parto, por Déa Aguiar

Autora: Déa Aguiar

Déa Aguiar - nasceu para cuidar de gente. Cantora, modelo plus size, mãe de três, amante das palavras. Idealizadora da Aêarana Hum

Hoje é dia da Saúde Mental Materna – precisamos falar sobre depressão pós-parto, pois, a cada quatro mulheres, uma sofrerá com esta doença. Por isso, confira o texto da Déa Aguiar:

Ela é sorrateira. Beneficia-se da negação, da exaustão e do preconceito.

Começou com insônia, depois a irritabilidade e então hipersensibilidade à luz e sons. Tudo muito bem justificado, afinal, um recém nascido traz uma grande demanda. Respiro fundo – vai passar!

Parece que o mundo está ligado num amplificador; o cachorro que se coça, a colher mexendo o café na xícara, a respiração das pessoas. O sono vem, mas o barulho dos pensamentos é ensurdecedor.

Eu deveria estar feliz. A memória falha, vejo fotos de poucos meses atrás e não sou capaz de reconhecer aquela mulher e a vida que ela tinha. Tudo me parece estranho, como se eu não pertencesse a este mundo. É difícil até definir em palavras o que sinto – mas o bebê chora, as crianças têm fome. A vida, enfim, tem suas demandas.

Duas horas da manhã, uma fralda cheia de cocô. Vou ao banheiro descartá-la e, ao acionar o pedal da lixeira, um pensamento: será que eles sabem o quanto os amo? Se eu morrer hoje, teriam a certeza do tamanho do amor que sinto?

Enquanto lavo as mãos, fito meus olhos no espelho. O que sinto, mesmo sem nome, me assusta.

Meu corpo dói, no entanto, a alma parece anestesiada por um tipo de exaustão jamais sentida. Sigo no piloto automático, porém em rompantes de lucidez, sou alertada pela minha consciência que já é hora de pedir ajuda. A apatia impede por meses a fio, até que sou obrigada a ir ao médico por um problema nos seios que me causava dores insuportáveis para amamentar.

Na consulta foi impossível fingir que estava tudo bem. Desmontei e, pela primeira vez em muito tempo, chorei e fui capaz de dar nome ao que sentia: ela, finalmente, começou a ser vencida, como nesses filmes de exorcismo, onde o demônio só pode ser expulso ao saberem seu nome.

Depressão pós-parto. Foi difícil falar, assumir e entender que, sim, “até eu”.
Parei de tentar encontrar um culpado e tenho lidado com os “e se” – depressão é algo que toda pessoa que respira corre o risco de ter.

Tendo nome, tem tratamento. E, assim, seguiremos até vencer mais essa. Um dia após o outro – alguns bons e outros nem tanto. E tudo bem – a inconstância faz parte a vida e, havendo vida, há esperança.

Postado por Carina

maio 5, 2021

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